segunda-feira, 22 de setembro de 2014

mulher de vermelho

o que será que ela quer
essa mulher de vermelho
alguma coisa ela quer
pra ter posto esse vestido
não pode ser apenas
uma escolha casual
podia ser um amarelo
verde ou talvez azul
mas ela escolheu vermelho
ela sabe o que ela quer
e ela escolheu vestido
e ela é uma mulher
então com base nesses fatos
eu já posso afirmar
que conheço o seu desejo
caro watson, elementar:
o que ela quer sou euzinho
sou euzinho o que ela quer
só pode ser euzinho
o que mais podia ser

"da série "mulher de" in: Um útero é do tamanho de um punho
Angélica Freitas

Uma mulher de vermelho está para além de uma visualidade. Uma mulher de vermelho é rastro, é vestígio de sua história, a história universal que toca a todas as mulheres. Assim como não há forma sem formação, não há imagem sem imaginação.

A forma de uma mulher de vermelho:
Marilyn Monroe, usou batom vermelho desde 1946.
Os homens preferem as loiras (1953)
Como agarrar um milionário (1953)
O pecado mora ao lado (1955)



Frida Kahlo, bissexual, teve um caso conjugal com Leon Trotski,
My grandparents (1936)
Roots (1943)
Sin esperanza (1945)



Cláudia Ferreira Silva, trabalhadora, negra, seu sangue inundou o peito e as ruas.
Acordou cedo.
Comprou pão.
Criou filhos.



A imagem como imaginação de uma mulher de vermelho:
Imaginar é mais que pertencer a uma possibilidade ficcional, frívola, não real. Imaginar é realizar. Uma mulher de vermelho toca o real, pois sua imagem arde, queima por meio da história, é cinza e é incômodo.

Porque imagem é outra coisa que um simples corte praticado no mundo dos aspectos visíveis. É uma impressão, é um rastro, é um traço visual do tempo que quis tocar, mas também de outros tempos suplementares - fatalmente anacrônicos, heterogêneos entre eles - que não pode, como arte da memória, não pode aglutinar. É cinza mesclada de vários braseiros, mais ou menos ardentes.

Shoshanna, Bastardos Inglórios (2009), judia, pinta o seu rosto diante de um espelho. Com a ponta dos dedos e blush, um gole de vinho, traça em vermelho a morte de Hitler.



Toda a mulher é uma mulher de vermelho.


Referência
Citações em itálico - Didi-Huberman. Quando as imagens tocam o real (2010). Disponível em eba.ufmg.br/revistapos


by Raquel Leão


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