quarta-feira, 25 de novembro de 2015

pra quem serve o poliamor?

Amar livremente, sem posse, sem hierarquias é uma ideia bem bonita. Bonita demais pra ser levada adiante por homem que quer uma desculpa pra trair a namorada ou chamar ela de louca ciumenta. Temos que rever que poliamor é esse que se prega por aí.



Amor, hierarquia, relacionamento saudável, pra mim, não tem nada a ver com monogamia ou relação livre/poliamor. Tem a ver com trabalho sobre si mesmo, maturidade, ética, respeito, empatia. Tu pode ter uma relação monogâmica por 20 anos ou 20 parceiros diferentes, se tu não tiver respeito, noção de privilégio, desconstrução de paradigmas ou maturidade, tu vai estar envolvido em um relacionamento hierárquico e provavelmente abusivo.

O discursinho do poliamor e do "não rotular relacionamentos" tem me irritado bastante. Principalmente porque vejo isso vindo de homens. Homens jovens, bonitos, brancos e ricos. Ominhos que impõem esse comportamento para as suas parceiras.

A ideia de poliamor não leva em conta nenhum recorte social. O simples fato de uma pessoa ser pobre e trabalhar muito já pode impedir que ela "pratique" esse desprendimento amoroso. Quando a pessoa é trans, negra, pobre, gorda, o poliamor não parece ser uma opção tranquila. Mas aqui vou me concentrar na relação "aberta" heterossexual, aquela que serve, muitas vezes, para legitimar a hierarquia patriarcal.

Claro que existe todo tipo de relação de "poliamor", mas vou falar daquelas que tenho mais conhecimento, que mais vi, que mais me parecem comuns e prejudiciais para a mulher:
1 - ominho fica com a menina
2 - se envolve com ela, começa a integrar na relação vários elementos de namoro
3 - aí percebe que namorar exige certos compromissos
4 - então ele começa a dizer para os amigos que não quer rotular sua relação, mas ele percebe que só não rotular não é o suficiente
5 - enfim ele diz pra menina que ele quer um relacionamento aberto
6 - a menina aceita para não ser chamada de moralista/possessiva
7 - o ominho fica com várias outras meninas
8 - a menina sofre
9 - a menina percebe que não tem porque sofrer e resolve então embarcar nessa ideia e fica com outros caras
10 - o ominho fica com ciúmes que a menina ficou com outros caras e volta atrás na sua decisão de poliamor

- Eu vou me matar sem você!
- Ok... mas não faz muita bagunça!


Existem mil outras opções possíveis para esse cenário que eu descrevi, mas dessa situação descrita aqui que me ocupo agora, pois vejo acontecendo o tempo todo e acho preocupante.

Isso que eu descrevi de 1 a 10 não é poliamor, viu ominho que adora discurso de amor livre? Isso é legitimação de machismo, de lógica patriarcal, de posse do homem sobre o corpo da mulher. Isso é achar que existe um tipo de liberdade para o homem e outro para a mulher. Isso é achar que existe "natureza masculina", aquela que justifica traição e violência.

Hoje ainda é muito difícil para uma mulher pensar nessa possibilidade de relacionamento. A gente sabe que, normalmente, quem acaba se ferindo somos nós. Quem vai ser chamada de vadia somos nós. Quem talvez engravide de um cara qualquer e fique sozinha tendo que fazer aborto clandestino somos nós. Mas, ainda assim, algumas minas têm achado legal essa ideia de não se prender a uma pessoa só, têm tentado ver como é essa tal libertação sexual (que já foi inclusive problematizada e criticada aqui no blog). Aí o problema é um homem que realmente goste de uma mulher livre assim. Por isso acredito ainda que, nessa altura da história, com essa onde conservadora louca dos últimos tempos, o poliamor (pelo menos heterossexual) praticamente não existe.

olha os "maridos" ciumentos inflados por sua natureza de macho!

Então propomos um outro exercício na vida: repensar relações hierárquicas e rever (todos os dias!) nossos privilégios. Qualquer relacionamento pode ser abusivo e não é o número de pessoas com quem tu faz sexo que vai mudar isso. A tua relação contigo mesmo pode ser abusiva também. De repente tenta mudar essa antes, a tua relação contigo, o jeito que tu te vê, o modo que tu percebe teus sentimentos e necessidades. Só uma pessoa livre de si mesmo, livre de seus medos é que pode proporcionar liberdade para os outros.


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