domingo, 7 de outubro de 2018

quebrando o silêncio

Precisei de silêncio depois de tanto grito. Briguei com tanta gente, conheci tanta gente, virei minha vida do avesso. E precisei de silêncio. Mas o contexto que nos esmaga exige o fim dessa quietude.

Não podemos ficar quietas. Nunca pudemos, na verdade. Umas mais do que outras. Mas agora a coisa mais linda desse mundo seria se nenhuma de nós abaixasse mais a cabeça, ficasse em silêncio, obedecesse sem questionar.

Nesse momento cada pequena decisão nossa conta muito. 

Como tu coloca o teu corpo no mundo? Quais espaços tu ocupa? Quais roupas tu escolhe pra vestir de manhã antes de trabalhar? Como tu corta o cabelo? Como tu anda na rua?

Se tu conseguiu passar até esse momento da vida sem ninguém te dizer, vou te contar uma coisa: TUDO QUE TU FAZ É POLÍTICO! Sabe aquela dieta pra tentar incansavelmente entrar num padrão? É uma decisão política! Sabe a calça que tu compra, a saia, a blusa, o batom, ou a falta que tu sente de todas essas coisas? Política!

Mais do que nunca precisamos pensar sobre os nossos corpos. O teu corpo é só mais um? Mais um corpo cinza, morno, padrão, invisível, igual a tantos outros? Tu quer ser isso? Por quê? O que te impede de ser outra coisa, outra mulher? Como tu pode tentar ser outra mulher hoje, agora? Como tu pode, hoje, recontar a tua história, ser dona da tua história, te narrar de um jeito potente, diferente, colorido, diverso, sujo, enfrentador?

Como tu te relaciona com as pessoas na tua volta? Tu pensa sobre isso? Tu apenas "convive com as diferenças" ou tenta pensar com elas, tenta te entrecruzar com elas? Tu apenas tolera aquela amiga meio tóxica, ou tu rompe com padrões preestabelecidos? Tu já pensou sobre a profundidade de uma decisão dessas?

Tu almoça com a família todo domingo? Tu ouve desaforos daquele tio? Tu diz "mas é família, né, tem que entender"? Se é família, se é importante, o melhor é continuar deixando que eles digam o que quiserem sem nenhuma consequência? Se a família é realmente importante pra ti, tu não quer que a tua mãe te conheça de verdade, saiba quem tu é? Tu não quer saber quem ela é? Tu quer continuar essa relação que acaba sendo quase um fardo? Como tu quer te relacionar com essas pessoas que tu diz amar? É o suficiente falar banalidades? Será que tu não pode ser mais verdadeira com eles? Será que tu não pode ser mais verdadeira CONTIGO?

Penso que estamos precisamos quebrar coisas. Quebrar padrões. Quebrar o homem, branco heteronormativo que existe dentro de todos nós. TODAS NÓS. Porque assim fomos ensinados, porque assim o mundo nos diz para ser. Todos precisam ser o homem, branco, hétero. Portanto, todos precisam violentar essa massa cinza e fraca vivendo na gente, e se manifestando em cada ato cometido.

Eu fiz algumas pequenas coisas que transformaram a minha vida. Parei de fazer dietas, me pesar, e me cercar de pessoas que o único objetivo da vida era ser magra. Mudei totalmente o jeito que eu me visto, falo, me comporto, Procurei quem eu realmente respeitava e amava e me agenciei a essas pessoas. Cortei aqueles que, depois de tanto tempo, ainda me violentavam, me machucavam e não me ouviam. Como mulher heterossexual, senti que precisava mudar a minha relação com TODOS os homens, em especial minhas relações amorosas. Comecei a estudar cada vez mais. Digo todos os dias para as amigas que eu admiro de verdade o quanto elas são incríveis. Digo pra mim todos os dias o quanto eu sou absurdamente forte. Tudo isso é diário, não existe "chegar lá".

E talvez, justamente, porque não existe "chegar lá" seja muito mais fácil ceder aos discursos que prometem esse "lá". A magreza, a riqueza, o casamento, a maternidade, o emprego. Esse monte de "lá" onde a gente tenta chegar. Amiga, isso não existe. Tu nunca vai chegar lá. E isso é lindo. Isso que é liberdade e plenitude. Liberdade de se transformar, de virar outra, de quebrar tudo, de se reinventar a todo o momento.

O que eu te peço é o mesmo que estou me exigindo nesse momento. Que pequena ação tu pode fazer para quebrar algum padrão na tua vida? Como tu pode, hoje, ser diferente do que tu é? O mundo tá precisando desesperadamente de que tu seja diferente.