Por que Ninfomaníaca, Lars Von Trier pode ser tão
desagradável pra muita gente?
Joe e as estocadas
É essa sua
primeira experiência sexual com um homem. Joe começa a se construir pela falta,
pela ausência de prazer. Pela brutalidade e pelo vazio do corpo. Quem em nossa
cultura está acostumado com a visão de uma mulher que não grita, não uiva de
prazer, graças ao incrível e poderoso falo? Joe interrompe o grito pelo
silêncio.
Joe dá pra quem quiser
É ela quem
decide para quem e quando. E pelos inúmeros pênis com os quais opera sua jornada
sexual dia após dia, Joe mantem-se implacável e intocada – ninguém jamais
conseguiu penetrar Joe.
Joe mente
Em cenas
carregadas de ironia, Joe mente para cada um dos homens o quanto eles a haviam
satisfeito e apresentado a ela o prazer supremo. Joe joga na cara o mal-estar
social da mulher que finge orgasmo.
Joe é incapaz de amar
Eliane Brum
escreveu pro El país, Joe se deixa
penetrar justamente para mostrar que não pode ser penetrada, preenchida. Sua existência estilhaça, para homens
e mulheres, a ausência inúmeras vezes experimentada em relações completamente
vazias com o corpo, com o sexo, com o outro e consigo.
Uma mulher urina em Joe
Ela precisa ser humilhada por todos, afinal, como pode
uma mulher ser tão insensível ao amor de um homem, a um filho, ao sexo? Só mesmo uma outra mulher pode colocar Joe no seu lugar - no chão.
Joe pode decidir sobre seu
corpo
Ela atira no homem que pensou poder tomá-la de vez.
Mesmo suja, humilhada, mulher que dá pra qualquer um, o poder de escolha ainda
é dela. Joe atira no olho de quem pensou que ninfomaníaca fosse um filme erótico e excitante. Sua suposta vulnerabilidade criada por meio das confissões produz o julgamento assassino do espectador, que pensou saber tudo sobre ela, que pensou dominá-la.
Joe é subversiva. Toda mulher é um pouco Joe.
by Raquel Leão
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