sexta-feira, 6 de março de 2015

pode homem no feminismo?

Quando a gente passa a dedicar um tempo maior da vida e um espaço maior na cabeça para questões sociais e lutas de minorias, a gente começa a entender um monte de coisa, a perceber preconceitos próprios que a gente nem sabia que tinha, a notar comportamentos errados que ninguém mais percebe. A gente começa, também, a ver muito preconceito e coisa errada dentro das próprias lutas. Às vezes, com a intenção de defender direitos, a gente acaba criando mais regras, mais segregação e só gera ódio. Tenho visto isso em algumas discussões específicas dentro do feminismo e diria que a mais polêmica é a participação masculina no feminismo.

Antes de qualquer coisa, já adianto que SEMPRE defendo as mulheres e entendo qualquer tipo de ataque que mulheres possam fazer aos homens. Esperar que as mulheres sejam calmas e pacíficas é a mesma coisa que cutucar um tigre dentro de uma jaula por anos, soltá-lo e esperar um abraço. Não espere calma e ponderação, espere pedras e gritos. Não tem como exigir outra coisa.



Daí vem a tal da misandria. Eu, particularmente, adoro uma misandriazinha, adoro provocar uzomi, adoro rir da cara de omexplicanista que acha que pode ditar regras sobre feminismo, que acha que feminismo é contrário de machismo, que feminismo é uma ditadura, que machismo não existe mais, que feminista é tudo louca neurótica. Esses ômi merecem muita misandria. E misandria não é só piada, é tática de luta. A Simone de Beauvoir aponta, no seu livro “O Segundo Sexo”, que um dos problemas da luta feminista é a difícil separação do homem e da mulher, o que não acontece em outros movimentos de minoria, que conseguem se separar da situação de opressão. A mulher tem mais dificuldade de se separar do homem, até porque muita mulher assume o discurso machista pra si, fazendo um monte de homem pensar que as feministas são todas piradas mesmo, porque olha só que legal essas outras mulheres bem comportadinhas concordando comigo.

Por isso nunca foi fácil defender o feminismo e por isso esses ataques todos que fazem com que as feministas sejam vistas como odiadoras de homens. E muitas vezes nós somos mesmo, não dá pra evitar. Por mais amorzinho querido que um homem seja, ele não sabe o que é ser mulher, ele nunca vai saber, aí ele pode achar que por ele ser muito legal e compreensivo ele pode falar o que pensa, aí ele pega e fala merda. E aí a gente pira, xinga, grita e o homem não entende. 



E com isso vem o assunto polêmico da participação masculina no feminismo. Qual é afinal o lugar do homem nesse movimento que é de mulheres? Por que eles querem participar? De que forma eles participam? Até onde eles podem se meter? Como diferenciar ajuda de tentativa de protagonismo? Precisamos mesmo de ajuda?

Um dos maiores medos que as mulheres têm de homem participando do feminismo é que o movimento acabaria só sendo legitimado com a voz masculina, com a aprovação masculina. E, obviamente, não é isso que a gente quer. A gente não quer ter nosso movimento roubado das nossas mãos, a gente quer poder decidir como, quando e onde lutar sem que nenhum homem nos venha cagar regra, como acontece em muitos outros momentos da vida. Quantas vezes na vida mulheres passam pela seguinte situação no trabalho, por exemplo: reunião com toda a galera do trabalho, a mulher dá uma ideia e essa ideia é descartada, ou nem ouvida; aí a mulher fala no ouvidinho do ômi do lado dela, ele repete pra galera e ganha uma salva de palmas pela brilhante iniciativa. Sim, parece neurose, mas acontece o tempo todo. É exatamente isso que pode acontecer com o feminismo se os homens tomarem conta. Vai deixar de ser feminismo, na verdade, vai passar a ser um bando de homem dando um pouquinho mais de direitos para as mulheres, mas só até onde eles se sentem confortáveis.



Mas uma outra coisa acontece: a regra de que homem não pode participar, falar, nem pensar no feminismo nunca na vida dele. Eu acompanho alguns grupos feministas, uns são só de mulheres e outros têm homens também. Esses que também têm homens são lugar de briga entre homem e mulher o tempo todo. Uma menina posta um texto, aí um cara vai lá e comenta. Meu deus, ele é destruído na mesma hora, surgem 250 milhões de gurias dizendo que ele tá querendo ditar regras no feminismo. Ok, é delicado um cara falar que não concorda com alguma coisa no feminismo, provavelmente ele tá errado, mas ali no grupo é o local de conversar sobre isso. Não se pode ditar regras tão brutas e de segregação em uma luta que busca por igualdade. Não se pode simplesmente dizer que homens não podem participar do feminismo sem pensar um pouquinho mais sobre isso. 

Têm várias coisas que os homens não podem fazer dentro do feminismo mesmo, a mais importante seria negar a dor feminina. Homem não pode, de jeito nenhum, dizer que uma mulher exagerou ao falar sobre seu sofrimento em relação ao seu gênero, porque ele não sabe o que é isso. Seria a mesma coisa que um branco falar que o negro nem sofre tanto assim, ele é que exagera. Isso é burrice, egocentrismo, falta de conhecimento sobre alteridade. Mas isso não significa que o homem não tem lugar no feminismo, até porque muitos reconhecem o quanto seria melhor pra eles se o mundo fosse feminista, enxergando o quanto eles também (não na mesma medida) são assujeitados pelo machismo.

Falar sobre esse assunto sendo feminista me coloca numa posição muito delicada. A cada palavra escrita eu posso cair na armadilha de defender homens e falar mal de mulheres. Porque o feminismo é exatamente isso: viver no perigo da segregação, ou "traição" do movimento. Para ser feminista precisamos aceitar essas ciladas. Não tem como separar homens e mulheres no mundo, o movimento feminista não é de segregação, mas de tentativa de viver juntos com igualdade de direitos. Acreditamos que isso é possível. Por isso não podemos expulsar tão rapidamente os homens do feminismo. Também não to querendo dividir igualmente a participação, de jeito nenhum. Vamos pensar juntas onde os homens podem atuar e realmente ajudar. Assumir o vocabulário misândrico sem entendê-lo não funciona. 

Isso é que caracteriza fundamentalmente a mulher: ela é o Outro dentro de uma totalidade cujos dois termos são necessários um ao outro. – Simone de Beauvoir

O papel dos homens no feminismo talvez seja com outros homens. Um homem realmente não vai ter o que fazer discutindo sobre feminismo com uma mulher, mesmo que ele saiba um monte de coisa, que leia, que seja super legal e defensor das minorias. Nesses casos surge o esquerdomacho. Para quem não está familiarizado com o termo, o esquerdomacho é aquele carinha que é tri de esquerda, inteligente, lê muito, se diz contra padrões de beleza, se diz inclusive feminista. Exatamente pelo esquerdomacho estar tão próximo do feminismo é que ele faz merda. Ele é tão super amigo das feministas que ele pensa que é igual a elas, que ele pode dizer que isso é legal, mas aquilo não tanto. E ainda usa de opressões machistas sem nem perceber.



Homem “feminista” é aquele que não tem medo de defender o feminismo na frente dozamiguinho machão. Que participa de grupo feminista, conversa com as gurias, tira dúvidas e vai lá dizer pro pai dele que a irmã pode sim dormir no quarto com o namorado. O homem que defende o feminismo não deixa a própria mãe cuidar da casa sozinha e lavar as cuequinhas dele. Esse homem que a gente aceita no feminismo é aquele que não “ajuda” a mulher, mas divide igualmente as tarefas, não importando qual seja. 

Se tu é homem, acredita na causa feminista, convive com feministas, lê sobre isso e quer participar, tudo bem, esse espaço pra ti pode existir, mas primeiro tu precisa abandonar uma coisinha que eu sempre vejo nesses caras “super legais”: não pode dizer “eu acredito no feminismo, mas tem umas feministas muito exageradas”. NÃO PODE, tu não sabe nada. Se tem feminista “exagerada” é porque tem que ter exagero e radicalismo mesmo e elas sabem o que sentem.

Também não espera aplausos por tomar boas atitudes e assumir discursos feministas. Tu não é nada demais por isso, não faz mais do que a tua obrigação como um cidadão decente. Toma cuidado com o que tu diz e pra quem tu diz. Não discorda tão rapidamente de uma feminista, ela sabe mais do que tu sobre o assunto, tu tem que ficar quieto, ouvir, pensar, olhar pra si mesmo e ver de que forma tu pode desconstruir o próprio machismo. Não entra num grupo feminista com o intuito de limitar as feminazi, a gente quer ser ditadora às vezes, isso é necessário e tu não tem que achar ruim. 

Gurias feministas, vamos continuar nadando no mar de male tears, vamos continuar sambando na cara de homenzinho de merda, vamos continuar nos empoderando. Mas não vamos dizer que homem tem que ficar longe do feminismo. Vamos convidá-los a aprender um pouco com a gente e mostrar o quanto o cara mais legal do mundo ainda é machista.

Eu sou contra a história de que homem não pode falar sobre feminismo, branco não pode falar sobre racismo, rico não pode falar sobre problemas sociais. Claro, nenhuma dessas classes dominadoras aí pode querer ensinar às minorias como lutar e como pensar, mas pode falar sobre o assunto, pode pensar, pode ler. E, principalmente, pode se reconhecer como privilegiado e fazer o possível para não abusar desse seu lugar e minimizar tudo que tu puder. Quer ajudar as minorias? Então saiba onde tu pode te meter, até onde tu pode ir, dá um passinho pra frente com muito cuidado, revisando cada detalhe das tuas atitudes. E se te receberem com raiva não leva pro lado pessoal, não é contra ti como indivíduo, mas contra ti como sujeito social que carrega discursos opressores que o pessoal reage. E eles estão certos. Menos mimimi sem informação, mais solidariedade e alteridade.

3 comentários:

  1. Conheço o feminismo há pouco tempo, e desde então, essa tem sido a minha maior dúvida. Eu sempre tive a impressão de que não podemos "excluir" os homens do feminismo, afinal, eles precisam se conscientizar da nossa luta, da nossa dor, do nosso sofrimento. Um homem que sabe o quanto seu gênero é privilegiado está apto a agir de forma diferente.
    Mas em diversos grupos, vejo uma divergência muito grande quando à participação do homem, quando afirma que "é feminista". Algumas dizem que homens podem sim ser feministas, outras dizem que homem não é feminista, homem que concorda com o feminismo é pró-feminista. E até hoje, eu nunca encontrei uma opinião ou definição séria e definitiva sobre isso. Afinal, o homem que concorda com a gente e pensa do mesmo jeito é o quê?

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  2. Nossa, quanta idiotice. Generalizações em cima de generalizações. Isso é coisa de quem se deu mal em relacionamentos com homens ou teve algum pai ruim e agora caga çela boca essas nerdas.
    E ques charges mais nada a ver. Puta que pariu. Tu és muito idiota!

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